EXCELENTISSIMO SENHOR PRESIDENTE DA COMISSÃO DE LEGISLAÇÃO, JUSTICA E REDAÇÃO FINAL DA E. CÂMARA DE VEREADORES DE ITAJAÍ, ESTADO DE SANTA CATARINA.
 
 
 
 
 
                                 RENATA NARCIZO MACHADO, vereadora eleita pelo Solidariedade, no exercício pleno dos direitos e prerrogativas inerentes ao seu mandato, vem mui respeitosamente perante a vossa honrosa presença, com fundamento no art. 63, do Regimento Interno desta E. Casa Legislativa, apresentar Contestação ao parecer contrário ao Projeto de Lei n° 67/2019, consoante os substratos que a seguir pede vênia para expor:
 
Senhor Presidente,
Senhores Vereadores.
 
                                  Em que pese o respeito tributado a esta r. Comissão e aos nobres pares, rebela-se a proponente contra a aprovação do parecer da relatora, que opinou pela rejeição do PLO 67/2019, em virtude da alegada inconstitucionalidade formal da propositura, por afronta aos princípios da Separação dos Poderes e da Reserva da Administração, eis que, segundo constou do malsinado parecer, a competência para dispor dessa matéria é exclusiva do Poder Executivo Municipal.
 
 
 
                                 O projeto em tela visa “Estabelecer a obrigação de acolhimento dos animais domésticos de pessoas em situação de rua nos espaços públicos ou privados que mantenham convênio, parceria ou contrato com o município de Itajaí”, e traz em seu teor o texto seguinte:
 
                                  PROJETO DE LEI ORDINÁRIA N° 67/2019
 
ESTABELECE A OBRIGAÇÃO DE ACOLHIMENTO DOS
ANIMAIS DOMÉSTICOS DE MORADORES DE RUA NOS
ESPAÇOS PÚBLICOS OU PRIVADOS QUE MANTENHAM CONVÊNIO, PARCERIA OU CONTRATO COM O MUNICÍPIO DE ITAJAÍ.
 
Art. 1° Para garantia da proteção e do bem-estar dos animais domésticos que vivem na rua junto com seus tutores, ficam obrigados os espaços públicos ou privados que mantenham convênio, parceria ou contrato com o Município de Itajaí, a abrigar e disponibilizar espaço para permanência dos animais domésticos sob responsabilidade de pessoas em situação de rua.
 
Art. 2° A permanência do animal no espaço deverá ser assegurada pelo período de estadia do morador em situação de rua que desejar acolhimento de seu animal de estimação.
Art. 3° O Poder Executivo, através do órgão responsável, regulamentará a aplicação desta Lei, no que for necessário,
No prazo de até 180 (cento e oitenta e dias).
 
Art. 4° Fica autorizada a celebração de convênios e parcerias com associações e organizações sociais para a execução do presente projeto.
 
Art. 5° Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
 
                                  O projeto visa garantir ao morador em situação de rua e seu animal de estimação, um local adequado e seguro enquanto usufrui dos serviços de acolhimento oferecidos pelo Município, em absoluta consonância com a Constituição Federal no seu artigo 1° incisos II e III, que tem como fundamento a cidadania e a dignidade da pessoa humana e também no seu artigo 225, §1º, VIII, reconhece que os animais são dotados de sensibilidade, impondo à sociedade e ao Estado o dever de respeitar a vida, a liberdade corporal e a integridade física desses seres, além de proibir expressamente as práticas que coloquem em risco a função ecológica, provoque a extinção ou submetam à crueldade qualquer animal.
 
                                  A resistência dos moradores de rua ao acolhimento em abrigo ocorre pelos mais variados motivos, desde a discordância quanto às regras do abrigo até a simples vontade de permanecer livremente pelas ruas da cidade. Um dos principais motivos de resistência é a proibição imposta pelos locais de abrigos em receber seus animais de estimação e acomoda-los junto ao seu dono. A amizade entre eles já é conhecida e notória pela nossa sociedade. É uma relação de carinho, cuidado e amor.
 
                                  Para as pessoas em situação de rua, por vezes, é a única relação de afeto que possuem em sua vida enxergando o companheirismo nos animais que não encontram nos humanos, sem esquecer da proteção que o animal muitas vezes fornece.
 
                                  Pois bem.
                                  Sabe-se que não pode a Câmara de Vereadores tomar a iniciativa de projetos que visem dispor sobre matéria de iniciativa reservada ao Chefe do Executivo, sob pena de, em caso de usurpação da iniciativa, eivar de inconstitucionalidade o texto legal daí decorrente.
 
                                  É visível que não se vislumbra na leitura dos cinco artigos antes transcritos, matéria tratada como sendo reservada a iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo, daí porque se impõe a revisão do parecer exarado por esta E. Comissão. Com efeito, o projeto de lei em discussão não interfere na Administração Pública direcionando a tomada de medidas pelo Chefe do Poder Executivo tampouco viola princípios constitucionais, apenas regulamenta uma ação já existente desde 2017 por iniciativa desta que vos-subscreve.
 
                                  De acordo com o Art. 30, inciso I da CF compete ao Município legislar sobre assuntos de interesse local. Vale dizer que o interesse público deve ser norteador de toda administração pública, seja ela origem executiva ou legislativa.
 
                                 Sobre o tema, Celso Antonio B. de Mello definiu:
 
O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é princípio geral do Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. Assim, não se radica em dispositivo algum da Constituição, ainda que inúmeros aludam ou impliquem manifestações concretas deles, como, por exemplo, os princípios da função social da propriedade da defesa do consumidor ou do meio ambiente(...). Afinal, o princípio em causa é um pressuposto lógico do convívio social. ” (BANDEIRA DE MELLO, 2011, Curso de Direito Administrativo.)
 
                        Sendo assim, havendo necessidade de proteção ao interesse público, que é geral e sobrepõe-se ao interesse de minorias, caberá ao Município, por meio da competência conferida constitucionalmente, promover devida tutela. Nesse mesmo sentido coleciona-se o Art. 163 da Lei Orgânica do Município, que no seu texto expõe que compete ao Município formular políticas municipais de assistência social.
 
                                  Dizer o contrário significa desconhecer a realidade, a legislação e as políticas públicas já existentes em nosso município. Nos dias de inverno esses abrigos já são disponibilizados as pessoas em situação de rua e seus animais salvando muitas vidas. Respeitosamente, esse parecer merece ser altamente censurado, tendo em vista que as estruturas, atribuições e serviços necessários para a execução das políticas descritas no Projeto de Lei já existem e são aplicadas no inverno pelo órgão responsável do Município.
 
 
                                 Vejamos:
 
                                 É forçoso rememorar que esse Projeto de Lei trata de assistência social e meio ambiente, mais especificadamente atendimento à população em situação de rua e a proteção dos animais.
 
                                  A Constituição Federal de 1988 prevê como fundamento no seu artigo 1°, a cidadania e a dignidade da pessoa humana e também traz como um dos seus princípios e objetivos a erradicação da pobreza e da marginalização, redução das desigualdades sociais e regionais, o bem de todos e a prevalência dos direitos humanos.
 
                                  Nesse sentido, foi promulgada a Lei Orgânica de Assistência Social n° 8.742/1993 (LOAS) que, no âmbito Federal dispõe sobre a organização da Assistência Social, destacando o Art. 23 que dispõe sobre a criação de programas de amparo à população em situação de rua.
 
Art. 23. Entendem-se por serviços socioassistenciais as atividades continuadas que visem à melhoria de vida da população e cujas ações, voltadas para as necessidades básicas, observem os objetivos, princípios e diretrizes estabelecidos nesta Lei.
 
 § 1o O regulamento instituirá os serviços socioassistenciais.
 
§ 2o Na organização dos serviços da assistência social serão criados programas de amparo, entre outros:
 
I - às crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social, em cumprimento ao disposto no art. 227 da Constituição Federal e na Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);
 
II - às pessoas que vivem em situação de rua.
(grifo nosso)
 
 
                                  Mas não é só, ainda no âmbito federal, o Decreto n° 7.053/2009 trata da política nacional para a população em situação de rua, bem como determina que política será articulada entre União, e demais entes federativos.
 
                                  A necessidade de respeitar a garantia da dignidade da população em situação de rua autonomia de seus  direitos e acesso a todos e quaisquer bem e serviços do Município, são mais que necessárias para acolher essa parte da população que sofre tanto. A realidade é que muitos desses moradores não aceitam ajuda do Município por ter que abandonar seus animais.
 
                                  Como se vê, sem maior dificuldade, a proposição não inova em absolutamente nada, pois os espaços para acolher as pessoas em situação de rua já existem e dispõem de estrutura necessária para acolher os animais. Não há qualquer previsão que crie, altere ou aumente as obrigações atualmente existentes.
 
                                   A norma pretendida, conforme já mencionado, trata de um direito inerente ao acesso de pessoas em situação de rua e seus animais a abrigos de nosso Município e constitui fundamento na Constituição Federal, nos princípios da cidadania, dignidade da pessoa humana e na proteção dos animais, visto a afinidade da população em situação de rua com seus animais.
 
                           Daí se permite afirmar, sem qualquer resquício de constrangimento, o desacerto do parecer aprovado por esta respeitável comissão, eis que não existe vício de iniciativa no projeto, pois, como visto, esses serviços e o Município já dispõe de todo o aparato físico, humano, administrativo, orçamentário e financeiro necessários para suprir as necessidades impostas no vertente projeto.
 
                                  Desde 2017 por iniciativa desta que vos subscreve, no inverno os abrigos públicos já acolhem esses moradores em situação de rua e seus animais. Logo, é indiscutível que o Projeto de Lei em tela, não interfere da Administração Pública direcionando a tomada de medidas do Chefe do Poder Executivo como explanado no parecer vergastado.
 
                                 Sob essa perspectiva, não se observa violação ao princípio da separação dos poderes, porque a matéria não faz parte do rol exclusivo do Chefe do Executivo. Por conseguinte, o artigo 84 da CF/88 e o artigo 29 da Lei Orgânica do Município estão devidamente salvaguardados. No ponto, o projeto de lei versa sobre tema de interesse geral da população, sem relação com matéria estritamente administrativa, razão pela qual pode decorrer de iniciativa parlamentar. 
 
                                 Sem se distanciar deste neste ângulo de visada, é possível aferir, a partir dos argumentos fático-jurídicos expostos neste petitório, que o PLO 67/2019 se insere na competência do Poder Legislativo, que cuida da elaboração de normas abstratas, gerais e obrigatórias, não atingindo atos concretos de administração, na medida em que seus dispositivos se limitam a dar efetividade a imposições Constitucionais – Federal e Estadual –, por meio de políticas públicas voltadas à dignidade da pessoa humana e a  proteção dos animais e, de forma indireta, a proteção do meio ambiente, sem invadir – ou usurpar – qualquer matéria de competência exclusiva do Poder Executivo.
 
 
                           Não reconhecer isso, equivale a fechar os olhos para uma dura e triste realidade de abandono e sofrimento dos animais, vivida no dia a dia daqueles que, a exemplo da vereadora proponente, se dedicam à causa animal. Mais do que isso, é virar de costas para uma questão que influi diretamente na vida dos nossos munícipes.
 
                                 Seja como for, é inegável que o Projeto de Lei não interfere e nem obriga o Poder Executivo a tomar medidas administrativas, que já dispõe de estrutura e material para execução das medidas propostas e nem viola o princípio da separação dos poderes. Em verdade, o que se busca é apenas regulamentar algo que já é praticado no Município e dar melhores condições de vida a população em situação de rua e seus animais, não os obrigando a abandonar aqueles que muitas vezes são seus únicos amigos.
 
 
                        Portanto, é de se reconhecer que o projeto de lei não adentra em matéria de cunho eminentemente administrativo, e, portanto, não padece de inconstitucionalidade, tratando de matéria relativa a promoção da cidadania, dignidade da pessoa humana e  proteção do meio ambiente, cuja competência é comum dos entes  federativos, cabendo ao Município atuar no âmbito do interesse local, de forma suplementar a legislação federal e estadual, no que couber, consoante os termos do art. 30, I e II, da Carta Magna.
 
                       Ante o exposto, por não concordar com parecer exarado, requer seja RECEBIDA a presente, porque tempestivamente ofertada, e ACOLHIDA, reconhecendo-se o desacerto do r. parecer exarado pela ilustre Vereadora Relatora, e, por conseguinte, que o PLO 67/2019 encontra os requisitos formais e materiais, sem óbice à constitucionalidade, juridicidade e legalidade, admitindo-se a sua regular tramitação, nos termos do § 5º do art. 63 da Resolução nº 564/15, observados os prazos do art. 56 do mesmo diploma normativo.
 
Nestes termos,
Pede deferimento.
 
 
                                                                                                                          Itajaí, 31 de Outubro de 2019.
 
 
                                                RENATA NARCIZO MACHADO
                                                            Vereadora - SD