CONTESTAÇÃO
OBJETO: PROJETO DE LEI ORDINÁRIA Nº 221/2017
AUTOR: Sergio Murilo Pereira
EMENTA: INCLUI EXAME PARA DETECÇÃO DE IMUNODEFICIÊNCIA COMBINADA GRAVE NO ROL DE EXAMES DO TESTE DE TRIAGEM NEONATAL OFERECIDO PELO MUNICÍPIO DE ITAJAÍ
I - RAZÕES DA CONTESTAÇÃO
Considerando que a r. Comissão de Legislação, Justiça e Redação Final acatou o Parecer Jurídico (sem número), que manifestou-se contrariamente à tramitação do Projeto de Lei Ordinária nº 221/2017, da lavra deste Vereador, que “Inclui exame para detecção de imunodeficiência combinada grave no rol do Teste de Triagem Neonatal oferecido pelo Município de Itajaí”, cumpre-me apresentar as razões a seguir, contestando o vosso r. Parecer:
PRELIMINARMENTE, cumpre registrar que esta Casa aprovou o Projeto de Lei de autoria do então vereador João Eduardo Vequi, que dispõe sobre a obrigatoriedade de exame auditivo em recém-nascidos, sem que ao ex-vereador se houvesse atribuído violação à reserva da administração e ao princípio da separação dos poderes.
Sobre o teste do pezinho, o Município de Itajaí afirma que “as ações integradas da Saúde da Criança incluem o Programa Nascer Itajaiense, o apoio à realização do teste do pezinho no laboratório municipal, [...]”[1], conforme se constata na transcrição a seguir:
Saúde da Criança
A infância é um período em que se desenvolve grande parte das potencialidades humanas. Os distúrbios que incidem nessa faixa etária ou idade são responsáveis por graves consequências para os indivíduos e têm futuras repercussões para toda a comunidade. A Política de Atenção a Saúde da Criança desenvolve Ações Integradas a Doenças Prevalentes na Infância e tem como principal objetivo acompanhar e integrar as ações para impedir o aumento da taxa de mortalidade infantil e o acompanhamento das necessidades individuais no curso de suas doenças, para o melhor resultado possível. As Ações Integradas da Saúde da Criança incluem o Programa Nascer Itajaiense, o apoio à realização do teste do pezinho no laboratório municipal, o apoio a manutenção do banco de leite humano do Hospital Marieta Konder Bornhausen como aliado a amamentação exclusiva. A realização da vacinação do Recém Nascido para Hepatite b e BCG, o teste da orelhinha, o teste do olhinho e o teste do coraçãozinho estes realizados na maternidade, mesmo antes da alta hospitalar da mãe e do bebê.
A Visita domiciliar ao Recém Nascido até o 7º dia de vida, as consultas de puericultura pré-agendadas pela Estratégia Saúde da Família com referência aos pediatras sempre que necessário, a manutenção do atendimento pediátrico 24h no Pronto Atendimento do São Vicente, o apoio integrado e acompanhamento pós-alta hospitalar das internações pediátricas no Hospital Pequeno Anjo.
As visitas domiciliares e a realização da classificação de risco, o atendimento preferencial abaixo de 1 ano de idade, o apoio nutricional as crianças de risco e com curva ponderal alterada, ações interdisciplinares em Unidades Escolares, a manutenção do calendário vacinal, o uso de tratamentos especializados quando necessários. Todas estas ações são avaliadas e acompanhadas pela Diretoria de Atenção a Saúde.
Esta afirmação consta do “Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes do Município de Itajaí”, de dezembro de 2016.
Aliás, Itajaí já conta com o Centro Integrado de Saúde Dr. Silvino Eing, dividido em três blocos, sendo que em um desses blocos está instalado o Laboratório Central de Análises Clínicas, com salas de coleta, laboratórios integrados – microbiologia, bioquímica, urinálise, imunologia, parasitologia – e sala de laudos[2].
Como se verifica pelo Decreto nº 10.831/2016, o Laboratório Central de Análises Clínicas já existia, tendo seu nome alterado, com a proposta de realocação para o CIS Dr. Silvino Eing.
Numa análise detida do artigo 29 da Lei Orgânica, esta proposição não cria cargos ou funções, não trata do regime jurídicos dos servidores, tampouco propõe criação, estruturação ou atribuições de secretarias, quando determina a inclusão de um único exame no Teste de Triagem Neonatal – Teste do Pezinho –, que já é oferecido pelo Município, sendo que este possui também laboratório de análises clínicas e pessoal já qualificado e com atribuições para tanto.
E a nossa Suprema Corte já pacificou entendimento no sentido de que não há burla à reserva de iniciativa do Chefe do Poder Executivo na hipótese em que o projeto de lei parlamentar trata de matéria de interesse local e de competência municipal:
ARE 756593 AgR / MG - MINAS GERAIS
AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO
Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI
Julgamento: 16/12/2014
Órgão Julgador: Primeira Turma
Publicação
ACÓRDÃO ELETRÔNICO
DJe-029 DIVULG 11-02-2015 PUBLIC 12-02-2015
Parte(s)
AGTE.(S): FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS - FEBRABAN
ADV.(A/S): FÁBIO MEDINA OSÓRIO E OUTRO(A/S)
AGDO.(A/S: CAMARA MUNICIPAL DE CONTAGEM E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S): RODRIGO SANTOS PINHEIRO
Ementa
EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Representação por inconstitucionalidade. Lei nº 4.344, de 29 de abril de 2010, do Município de Contagem/MG, que obriga agências bancárias a instalarem divisórias entre os caixas e o espaço reservado para os clientes que aguardam atendimento. Lei de iniciativa parlamentar. Ausência de vício formal de iniciativa. Matéria de interesse local. Competência municipal. Precedentes[3].
Imperativo, ainda, colacionar o precedente a seguir transcrito, aplicável ao caso em exame, da lavra do eminente Ministro Celso de Mello:
[...] iniciativa reservada, por constituir matéria de direito estrito,
não se presume e nem comporta interpretação ampliativa, na medida em que, por implicar limitação ao poder de instauração do processo legislativo, deve necessariamente derivar de norma constitucional explícita e inequívoca[4]. (ADI 724-MC, Rel. Min. Celso de Mello, julgamento em 7-5-1992, Plenário, DJ de 27-4-2001, g.n.)
Desta feita, a situação tratada nesta proposição não se encaixa em nenhuma das hipóteses taxativamente tipificadas, de reserva de iniciativa do Poder Executivo.
Pelo contrário, o que se verifica é a presença total e irrestrita do interesse público, com intuito de assegurar o direito da criança, nos termos do “Plano Decenal dos Direitos Humanos de Crianças e Adolescentes do Município de Itajaí”, de dezembro de 2016.
A legalidade é visível, até porque, segundo a Constituição da República Federativa do Brasil, compete ao Município legislar sobre assuntos de interesse local e suplementar a legislação federal e estadual no que couber.
O que quer significar que legislam o Prefeito e os Vereadores, conjuntamente, que são as autoridades representativas dos eleitores do Município:
Art. 30 Compete ao Município:
I – legislar sobre assuntos de interesse local;
II – suplementar a legislação federal e a estadual no que couber;
[...]
No seu Parecer em Ação Direta de Inconstitucionalidade, o Subprocurador-Geral de Justiça do Ministério Público de São Paulo, Nilo Spinola Salgado Filho[5], em 12 de maio de 2014, com muita propriedade, assim se pronunciou:
[...]
4. É impossível invocar-se como parâmetro o art. 61, § 1º, II, b, da Constituição da República, por ser norma específica destinada exclusivamente à organização administrativa, serviços públicos e matéria tributária e orçamentária dos Territórios. Neste sentido, pronuncia o Supremo Tribunal Federal que:
“(...) a reserva de lei de iniciativa do chefe do Executivo, prevista no art. 61, § 1º, II, b, da Constituição, somente se aplica aos Territórios federais (...)” (STF, ADI 2.447-MG, Tribunal Pleno, Rel. Min. Joaquim Barbosa, 04-03-2009, v.u., DJe 04-12-2009).
5. A reserva de iniciativa legislativa do Chefe do Poder Executivo deve ser explícita e interpretada restritivamente, alijando exegese ampliativa ou presunção, conforme alvitra a doutrina (J. H. Meirelles Teixeira. Curso de Direito Constitucional, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1991, pp. 581, 592-593) e enuncia a jurisprudência (STF, ADI-MC 724-RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Celso de Mello, DJ 27-04-2001; RT 866/112; STF, ADI 3.394, Rel. Min. Eros Grau, 02-04-2007, DJe 15-08-2008; STF, ADI 3.205, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, 19-10-2006, DJ 17-11-2006), tendo em vista que em se tratando de processo legislativo as normas do modelo federal são aplicáveis e extensíveis por simetria às demais órbitas federativas (STF, ADI 2.719-1-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 20-03-2003, v.u.; STF, ADI 2.731-ES, Tribunal Pleno, Rel. Min. Carlos Velloso, 02-03-2003, v.u., DJ 25-04-2003, p. 33; STF, ADI 1.594-RN, Tribunal Pleno, Rel. Min. Eros Grau, 04-06-2008, v.u., DJe 22-08-2008; RT 850/180; RTJ 193/832).
[...]
11. Resta saber se a lei atende à competência normativa da matéria. Não há dúvida que o Município pode tutelar o meio ambiente e a saúde pública desde que não nulifique a competência normativa federal ou estadual. Esse é o limite da autonomia municipal. [...].
[...]
Estas, Excelentíssimo Presidente, são as razões que demonstram inequivocamente que o Projeto de Lei nº 221/2017 não contém qualquer vício que o torne inconstitucional ou ilegal, pelo que este Vereador REQUER o seu recebimento e a sua discussão pelos membros da r. Comissão, para que seja declarado constitucional e legal, a fim de que seja levado a Plenário para votação. Assim não entendendo Vossas Excelências, REQUER que o Parecer seja deliberado pelo Plenário, nos termos do § 3º do art. 63 do Regimento Interno.
[2] Fonte: https://itajai.sc.gov.br/noticia/16306/60#.WkZVZFWnHIU
Sergio Murilo Pereira